A Embrapa Amapá participou da Oficina de Boas Práticas de Fabricação de Açaí Seguro, promovida pelo Ministério Público do Amapá (MP-AP), por intermédio da Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público, da Cidadania e Consumidor da Comarca de Santana, através da demonstração prática dos procedimentos que devem ser adotados nas batedeiras de açaí para garantir um alimento seguro. Santana, junto com Macapá e Laranjal do Jari, são os três municípios do Amapá onde foram registrados quase 30 novos casos de doença de Chagas este ano, e a Secretaria Estadual de Saúde atribui a maioria dos casos ao consumo de açaí contaminado pelo contato ou fezes do inseto barbeiro.
A Oficina reuniu 46 agentes comunitários de endemias e fiscais sanitários do município de Santana, que estão recebendo treinamento e readequação de função (no caso dos agentes) com o objetivo de intensificar a fiscalização das batedeiras de açaí quanto ao cumprimento da Legislação Estadual de Boas Práticas de Fabricação do açaí, bacaba e patauá (Lei n°1.914, 2015), que trata do Programa Estadual de Qualidade do Açaí. Entre os fiscais participantes estava Renato Ulisses Fonseca, atuante há 10 anos no município de Santana. “Este trabalho de fiscalizar os estabelecimentos comerciais faz parte da nossa rotina, mas não especificamente para verificar a legislação com a intensificação que vamos ter agora. Acredito que muitas doenças estão relacionadas com açaí contaminado, à forma como ele é fabricado, distribuído e comercializado. Nosso treinamento e a fiscalização vem agregar esforços para eliminar riscos à saúde por conta do açaí contaminado”. A agente de endemias, Clores Lima, expressou sua preocupação também como consumidora. “É preocupante, a maioria das batedeiras não atendem aos requisitos de licenciamento da vigilância sanitária e não possuem padrão adequado. Quanto ao curso, estou achando ótimo, vou melhorar meu modo de falar com o batedor de açaí. Está ajudando muito nos esclarecimentos, eu não sabia dessa forma correta de coletar e catar o açaí”, acrescentou a agente. A coordenadora da Vigilância Municipal em Saúde, Thalita Flexa, informou que a primeira etapa da força tarefa da fiscalização será iniciada na primeira quinzena de novembro. “O principal foco é o combate à doença de Chagas, e para isso formarmos uma força tarefa. Primeiro teremos uma abordagem educativa, que deve durar em torno de dois meses. O trabalho será feito em conjunto com os agentes de endemias e os fiscais sanitários do município de Santana”.
O chefe-geral interino da Embrapa Amapá, Nagib Melem, destacou a iniciativa da Promotoria de Justiça do Ministério Público de Santana, para “conseguirmos atuar nesse problema tão sério que atinge a nossa população, pois o açaí é um dos nossos principais alimentos e uma das principais cadeias produtivas do Amapá”. E citou números que expressam a importância desta cadeia produtiva na economia do estado: em torno de R$ 600 milhões por ano. “Isso não é pouco. Então, é muito importante essa questão, não só do ponto de vista econômico, mas também de saúde pública e no aspecto social. Temos que ter o açaí de todo dia, mas temos que fornecer e termos um alimento seguro. Esperamos que esta iniciativa em Santana se espalhe por outros municípios, porque a solução existe, temos tecnologias para combater o protozoário causador da doença de Chagas, existe uma lei estadual, há uma política pública que precisa ser implementada”.
Nos dias 30 e 31 de outubro, a pesquisadora Valeria Saldanha Bezerra conduziu o módulo dos procedimentos práticos, através do uso de equipamentos da Embrapa instalados no prédio do Ministério Público. Os participantes acompanharam as orientações de como realizar o choque térmico nos frutos de açaí para eliminar o protozoário causador da Doença de Chagas. Inicialmente os frutos do açaí higienizados devem ser mergulhados em água aquecida à temperatura entre 80°C a 90°C durante 10 segundos, em seguida os frutos devem ser resfriados em outro tanque com água com temperatura ambiente, por dois minutos. “A diferença de temperaturas das águas, ou o choque térmico, é que provoca a inativação do protozoário que transmite a Doença de Chagas”, explicou a pesquisadora, responsável pelo tema “Demonstração prática das principais etapas de controle do barbeiro e inativação do protozoário Trypanosoma cruzi (agente causador da doença de Chagas)”. Ela destacou aos participantes que a água usada para resfriar os frutos deve ser de boa qualidade. “O mais indicado é usar água clorada. Isso evita uma possível recontaminação do fruto por microorganismos causadores de doenças infecciosas, e que podem estar presentes na água utilizada neste processo”, acrescentou a pesquisadora, doutora em Ciência dos Alimentos. Durante a Oficina, a Embrapa distribuiu exemplares da cartilha “Planejando uma batedeira de açaí”.
O promotor de Justiça, João Paulo de Oliveira Furlan, articulou os vários órgãos e instituições envolvidos na cadeia produtiva do açaí e na regularização sanitária de batedeiras para viabilizar uma força tarefa de intensificação da fiscalização das batedeiras de açaí de Santana. Durante a abertura da Oficina, ele agradeceu o empenho conjunto e ressaltou que o esforço é de grande importância para a saúde alimentar. “Estamos contribuindo para habilitar as batedeiras de açaí a fazer um processo correto para evitar doenças aos consumidores. Recentemente, tivemos vários casos de doença de Chagas, e devido às dificuldades da Vigilância Sanitária do Município estamos agregando a Vigilância Sanitária Estadual, a Embrapa, Iepa, Lacen, Sebrae e outros órgãos, e pedindo o apoio dos agentes de endemias. Vamos fazer um trabalho em algumas frentes, primeiro o educativo, levando o conhecimento sobre o modo correto do preparo do açaí. Depois da fase educativa, vamos para fase da regularização das batedeiras e depois a fase repressiva. Vamos fornecer inicialmente as informações para que passem a atuar de forma correta e caso isso não ocorra, por comodismo ou omissão, vamos entrar para a parte repressiva. Então será muito importante esse conhecimento para vocês (participantes da oficina), agradeço o empenho de todos”, finalizou o Promotor.
Como parte da programação, a fiscal sanitário da Vigilância Sanitária Estadual, Marília de Almeida Luz Costa, fez uma palestra sobre a conduta e postura do fiscal. “Estamos aqui para contribuir com o aprendizado dos fiscais e de agentes que vão ingressar nesta importante ação de fiscalização. A postura adequada de um fiscal não é menos importante do que aprender e saber interpretar a legislação, devemos saber como nos comportar e conduzir durante uma fiscalização. Um fiscal sem postura ou que não sabe conduzir seu trabalho pode acabar comprometendo todo o trabalho desenvolvido”, ressaltou Marília Costa. Também integrante da Vigilância Sanitária Estadual, a fiscal sanitário Silvia Cristina da Silva Pedroso Magalhães abordou, de forma detalhada, os pontos da Legislação Estadual de Boas Práticas de Fabricação do açaí e bacaba (Lei n°1.914, 2015). Ela adotou uma metodologia participativa, incluindo os agentes de endemias e fiscais participantes da Oficina na condução de interpretação e tira dúvidas dos artigos da Lei. A construção dos processos para se obter o licenciamento ou abertura de auto de infração com interdição do estabelecimento (batedeiras) também foi tema da Oficina realizada em Santana, também conduzido pelas fiscais da Vigilância Sanitária Estadual. Os demais módulos trataram sobre “Boas Práticas de Fabricação do açaí e bacaba”; e “Doença de Chagas e o açaí: como reconhecer e coletar o barbeiro”, tendo como instrutor o pesquisador do Iepa, André de Siqueira Mendes do Amaral.
A realização desta Oficina deu sequencia a uma articulação inicial da Promotoria de Justiça da Comarca de Santana, quando tomou a iniciativa de reunir gestores e técnicos da Secretaria Municipal de Saúde de Santana (Coordenadoria da Vigilância em Saúde), da Embrapa, do Sebrae, do Iepa, da Associação dos Batedores de Açaí e da Secretaria Estadual de Saúde (Vigilância Sanitária Estadual) e da Diagro. Na ocasião, o promotor João Furlan reforçou a importância da realização de um esforço conjunto para fiscalizar as batedeiras de açaí naquele município, principalmente diante da confirmação do aumento de casos de doença de Chagas. De acordo com dados da Associação dos Batedores de Açaí, um levantamento realizado em 2016 aponta o registro de 676 batedeiras de açaí em Santana (sendo 31 legalizadas), porém, a própria entidade e a Coordenadoria Municipal da Vigilância em Saúde acreditam que atualmente existam em torno de mil batedeiras funcionando no município.
Na ocasião, a Promotoria Defesa do Patrimônio Público, da Cidadania e do Consumidor definiu junto com os participantes da reunião, as seguintes etapas da força tarefa. Na frente educativa, devem ser distribuídos aos batedores de açaí folderes e cartilhas de orientações das Boas Práticas de Fabricação; a frente de regularização atuará esclarecendo que haverá fiscalização sobre o cumprimento dos procedimentos necessários, estabelecendo prazo para regularização, tanto de higienização, estrutura e metodologia; e na frente de conscientização dos consumidores, deve ser realizada ação de divulgação nos meios de comunicação.
Dulcivânia Freitas (DRT-PB 1.063/96)
Embrapa Amapá